Como alimentar nove bilhões de pessoas em 2050?

Especialistas indicam caminhos para garantir a segurança alimentar de uma população que não para de crescer

Um estudo publicado na revista científica Plos One causou frisson ao afirmar que em 2050 não teremos comida suficiente para alimentar a população mundial – que, segundo dados da FAO (Food and Agriculture Organization), passará de 9 bilhões de pessoas.
O argumento é de que o rendimento das culturas agrícolas não está crescendo o suficiente, e, em alguns casos, os agricultores estão se deparando com um limite biológico que nem a genética e a biotecnologia parecem conseguir ultrapassar.
Confrontados com essa nova realidade, a tendência é de que os agricultores apelem para o desmatamento das florestas em busca de mais áreas agricultáveis. Isso representaria um aumento da emissão de CO2 na atmosfera, além de um grande risco para abiodiversidade.
Neste contexto, como garantir a segurança alimentar para uma população que não para de crescer, sem causar danos ao meio ambiente? Comer inseto, segundo a FAO, seria uma solução. Mas a transição para a entomofagia, como é chamada a dieta a base desses organismos ricos em proteínas, apesar de representar uma alternativa para reduzir a fome de forma sustentável – em comparação com a produção de carne, demanda menos quantidade de terra e outros recursos - pode parecer menos atraente que outras alternativas que, segundo os cientistas, também podem ajudar. 
Agricultura familiar
Em um aspecto, parece haver um consenso geral: a agricultura familiar – que já é importante para a produção de alimentos hoje – será de vital importância para atender a demanda do crescimento populacional nas próximas décadas. 
Em 2009, segundo dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), a agricultura familiar já ocupava quase 85% dos estabelecimentos agropecuários do país. Além disso, em 2006 ela era responsável por grande parte da alimentação básica dos brasileiros, originando 87% da produção nacional de mandioca, 70% da produção de feijão, 46% do milho, e 38% do café.
Mas a demanda vai crescer. “Até 2050 nós vamos ter que aumentar a produção de alimentos em 70% para suprir o aumento populacional e o equilíbrio social no planeta”, afirmou Marcos Buckeridge, biólogo e coordenador do Instituto Nacional de Ciência e Tecnologia do Bioetanol. Segundo ele, o Brasil é o único lugar do planeta que possui área agricultável em ambiente com estabilidade política.
“O próximo lugar é a África, mas a região ainda tem uma série de problemas políticos. Nós, brasileiros, já estamos tentando ajudar. A Embrapa já está lá, e nós estamos estudando todo esse processo, porque só com o Brasil não vai ser possível”, explicou o especialista.
Alimentos geneticamente modificados
Buckeridge defende ainda a aplicação de tecnologias como a de organismos geneticamente modificados (OGMs). “O milho geneticamente modificado, por exemplo, pode produzir até 30% mais. Nós vamos ter que entrar nessa era”, afirmou o biólogo. Além disso, ele vê com bons olhos o melhoramento das espécies botânicas para que elas resistam às mudanças climáticas, que avançam cada vez mais rapidamente sobre o planeta.
A introdução de transgênicos na natureza entretanto está cercada de polêmicas. Ambientalistas argumentam que tal prática expõe nossa biodiversidade a sérios riscos, como a perda ou alteração do patrimônio genético das plantas e sementes e o aumento no uso de agrotóxicos mais fortes. 
Alimentos orgânicos
Defensor de outra saída, Paulo Kageyama, engenheiro agrônomo e colaborador do Ministério do Meio Ambiente, diz que o país deve explorar sua biodiversidade natural.
Kageyama trabalha em parceria com a Escola Superior de Agricultura Luiz de Queiroz (Esalq/USP) e o Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra), desenvolvendo estudos e pesquisas em assentamentos agroecológicos. 
Em Apiaí, no Vale do Ribeira, em São Paulo, o modelo de agricultura sustentável e produção de alimentos orgânicos foi adotado para conciliar o desenvolvimento socioeconômico das famílias assentadas com a preservação e recuperação ambiental.
“Trabalhamos com modelos que sejam mais sustentáveis, levando em conta a biodiversidade. Se temos uma grande quantidade de terras, vamos derrubar tudo e plantar uma só espécie, como um transgênico? Nós plantamos de 20 a 30 espécies diferentes, sem usar agrotóxicos”, explica o engenheiro. 
Segundo dados do especialista, se compararmos o plantio de tomate orgânico e convencional em Apiaí, percebemos que a produção orgânica demanda mais terras que a tradicional. Contudo, enquanto o plantio de alimentos convencionais inclui 36 aplicações de agrotóxicos – o que corresponde a 80% do custo de produção, segundo Kageyama -, o cultivo orgânico é livre de qualquer componente químico, sendo mais benéfico à saúde humana. Além disso, protege a qualidade da água, a fertilidade do solo e a vida silvestre, conservando a biodiversidade.

Fonte: Exame

Nenhum comentário:

Postar um comentário